domingo, 9 de setembro de 2007

Pronúncia

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS
TRIBUNAL DO JÚRI DE BRASÍLIA


Processo nº 83.201-4/01
Acusado: THIAGO DOS SANTOS ROMÃO

Vistos etc.
THIAGO DOS SANTOS ROMÃO, qualificado nos autos, foi denunciado por ter estrangulado a jovem Ana Paula Fontes da Silva, utilizando-se peça de vestuário da mesma. A inicial ressalta que o fato deu-se por motivo torpe, pois a vítima havia subtraído uma arma do denunciado e este insistentemente cobrava o valor do bem. Não conseguindo o intento, arquitetou matar a vítima para vingar-se.
A inicial veio acompanhada do inquérito instaurado na 1ª Delegacia Policial, do qual constam, de relevantes, a comunicação de localização de cadáver de fls. 14/16, o laudo de exame cadavérico do qual se constata que a morte ocorreu por asfixia mecânica devido a estrangulamento, às fls. 44/45, o laudo de perícia necropapiloscópica de fls. 46/54, laudo de exame de local de cadáver encontrado de fls. 135/151 e o relatório final de fls. 92/97. Veio aos autos o boletim de antecedentes de fls. 111/112.
O réu, interrogado em juízo, negou a autoria. Anteriormente, na fase policial, fizera uso da prerrogativa constitucional de permanecer calado. Apresentou defesa prévia. As testemunhas arroladas foram ouvidas. As partes ofereceram alegações finais.
É o relatório. Decido.
O Código de Processo Penal, no artigo 408, caput, dispõe: “Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento.”
Portanto, para a pronúncia bastam indícios da autoria, não se exigindo a certeza plena.
José Frederico Marques, na obra Estudos de Direito e Processo Penal em Homenagem a Nelson Hungria ressalta: “Para a pronúncia tem de ser certa a existência do crime e provável a autoria imputada ao réu. Se apenas razoável a existência do crime, não pode haver pronúncia, e o mesmo se verifica quando tão-só possível a autoria ao denunciado é atribuída.” (Encerramento da Formação da Culpa no Processo Penal). Destarte, a pronúncia só está autorizada quando há indícios suficientes, sérios e convincentes.” (os grifos não constam do original)
Vicente Grecco Filho, citado pela defesa, leciona: “Indício suficiente de autoria significa a existência de elementos probatórios que convençam da possibilidade razoável de que o réu tenha sido o autor da infração.”(Manual de Processo Penal)
Na hipótese dos autos, o suporte probatório autoriza a pronúncia, juízo probatório, sem embargo das brilhantes razões oferecidas pela defesa, que postulou a impronúncia.
A materialidade resta incontroversa. Os laudos de exame de corpo de delito cadavérico e o laudo de exame de local de cadáver encontrado não deixam dúvidas.
Quanto à autoria, sem adentrar a prova produzida, o que equivaleria a subtrair dos jurados o cotejo das contradições listadas pela defesa, o envolvimento do réu com a vítima pela prática de uso e tráfico de entorpecentes e a subtração de um revólver de propriedade do acusado pela infeliz jovem, viciada desde os doze anos de idade, a ponto de vender o corpo em troca de drogas, dão credibilidade às declarações de Ivone Francisca da Silva Borges que, em juízo, sob o crivo do contraditório, “viu Thiago um dia antes da vítima morrer; que ouviu o acusado fazer a seguinte ameaça à vítima: “você está devendo e vai me pagar”; que Talita disse à depoente que o acusado falou que ia matar a vítima; que Paulinha falou para Talita, para a depoente e para outra pessoa, cujo nome não se lembra, que o acusado disse que ia matá-la (...)” (fls. 202), Aliás, Ana Paula já suplicara à mesma testemunha: “pelo amor de Deus, não me deixe sozinha com o acusado”. Também deve ser consignado que a vítima foi vista na carroça de Thiago.
Assim, embora a vítima mantivesse conduta social que favorecia a presença de desafetos, a irresignação do ex-companheiro pelo fato de se saber traído e o fato de freqüentar locais de venda e consumo de drogas, sendo de sabença geral a intolerância dos traficantes, que não hesitam em dar cabo à vida dos devedores, até mesmo para servir de exemplo a outros viciados, verifica-se que a negativa do réu não pode ser aceita de forma irrestrita nesta fase processual.
Quanto às qualificadoras, estão bem demonstradas. A asfixia mecânica por estrangulamento, objetiva, está estampada no laudo de exame cadavérico, corroborado pelas fotografias anexadas ao laudo de exame de local.
Em relação ao motivo torpe, a prova colhida demonstra que o acusado sempre mencionava o fato de a vítima Ter-lhe subtraído uma arma e qe, de forma insistente e pública, cobrava o valor que julgava devido. Não escondia da comunidade que, à vista do “calote”, pretendia exterminá-la.
Ante o exposto, com fundamento no artigo 408, caput, do Código de Processo Penal, julgo procedente a denúncia para PRONUNCIAR THIAGO DOS SANTOS ROMÃO, a fim de que seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos I e III, do Código Penal.
O pronunciado foi preso por força de prisão temporária. Posteriormente, teve a prisão preventiva decretada. Não faz jus a aguardar o julgamento em liberdade, pois continuam presentes os requisitos exigidos pelo Código de Processo Penal. As peculiaridades dos processos submetidos ao Tribunal do Júri, em que o julgamento só é realizado com a presença do réu e o fato de ter empreendido fuga depois do crime, tendo sido capturado em outra unidade Federação, pelo cometimento e outro crime indicam que a constrição cautelar deve ser mantida. O crime que lhe é imputado é hediondo.

P.R.I.
Brasília, 25 de abril de 2002

Sandra De Santis M. de F. Mello
Juíza de Direito

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